Crítica – Trama Fantasma (2017)


Sobre um relacionamento doentio


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Paul Thomas Anderson é um dos diretores mais bem reconhecidos em Hollywood atualmente. Na sua curta filmografia estão 8 filmes adorados por muitos como Boogie Nights – Prazer Sem Limites (1997), Magnolia (1999), Sangue Negro (2007) e O Mestre (2012). Trama Fantasma, o oitavo, apesar de excelente, está longe de ser comparado aos melhores do diretor. Porque neste ele não é tão fervoroso, apaixonado e literal. Há um amadurecimento na técnica que nem sempre significa melhoria.

Ele faz parte de um seleto grupo de diretores-autores. Isso porque, além de dirigir, ele escreve e produz, o que o coloca numa posição de controle da obra. Seus filmes são facilmente identificados pela sua forte veia autoral. Alguns dos seus traços são: premissas simples baseadas em forte estudo de personagem, planos longos e direção de atores muito acima da média.

Em Trama Fantasma, a história acompanha o dia-a-dia de um estilista famoso de Londres nos anos 50 chamado Reynolds Woodcock, que ganha vida na pele de Daniel Day-Lewis (Meu Pé Esquerdo, Lincoln), e é narrada por Alma, personagem de Vicky Krieps (Anônimo, Hanna). Ele é homem mimado que precisa ser o centro das atenções, vive criando peças e diz que perde o seu dia caso alguém faça mais barulho do que o normal durante o café da manhã. Reynolds nunca superou a perda da mãe e vive solteiro, pois nenhuma mulher se encaixa nos seus altos padrões. Isso até conhecer Alma. Ela é uma garçonete estrangeira por quem ele se apaixona. Lesley Manville (Another Year, Sr. Turner) vive Cyril Woodcock, a irmã do estilista que ocupa a posição que seria da mãe deles. Há, em Reynolds, fortes traços de um Complexo de Édipo, desenvolvidos ao longo do filme.

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Apesar de narrado por Alma, ela é a personagem cujo filme menos desenvolve. Não se conhece seu passado, muito menos entende-se suas motivações ao longo da obra. Seu nome, entretanto, prenuncia a mudança que vai acontecer na casa dos Woodcock com a sua chegada. Um lugar sem vida, mesmo sendo o berço de criação de peças de alta costura, mas que funciona como uma máquina. A presença da garçonete desestabiliza a relação entre os irmãos e, posteriormente, cria-se um jogo de abuso e poder entre Alma e Reynolds. Eles formam um casal não convencional, doentio, mas que funciona para os dois, mesmo desgastante física e emocionalmente.

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Daniel Day-Lewis, infelizmente, anunciou que este seria seu último filme antes da aposentadoria. E sua atuação não está nada menos que magnífica. Ele é um dos atores que melhor aplica os conceitos do Método de Interpretação devido ao seu estudo e entrega aos personagens. No longo, ele faz esse personagem ser controlador, forte, que subjuga todos a sua volta, e, ao mesmo tempo, extremamente vulnerável. Lesley Manville e Vicky Krieps, cada uma à sua maneira, fazem trabalhos primorosos. No início, tanto as atuações quanto o roteiro não soam naturais. Os personagens, a princípio, são todos unidimensionais, mas vão ganhando camadas de interpretações ao longo do filme e terminam tão complexos que fica quase impossível de acompanhar suas linhas de raciocínio.

O ritmo do filme é bastante lento e sem grandes reviravoltas, mas dá tempo ao espectador para contemplar as atuações e toda a estética da obra. Há um tom de suspense, coroado pela sequência final do longa, que prende a atenção mesmo para uma trama ambientada num universo remoto para a maioria da audiência, a sociedade inglesa da alta costura dos anos de 1950. O roteiro chega a ser imprevisível em alguns momentos, mas para conseguir tal feito, PTA leva a história para alguns lugares e não conclui depois, deixando algumas pontas e encaminhamentos que seriam interessantes em aberto. Mas isso tudo porque seu real interesse é estudar os três personagens principais e suas relações.

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Há um controle formal de PTA em algumas cenas como a do desfile na qual tudo começa como o protagonista planejava e, aos poucos, Reynolds perde o domínio da situação e a montagem do filme o acompanha se tornando erradica. Por outro lado, o diretor se permite um descontrole emocional em outras como a do jantar preparado por Alma onde o casal briga e há um improviso na entrega das falas.

O figurino, impecável, retrata a alta sociedade londrina à perfeição. As criações de Reynolds transparecem sua personalidade. A fotografia usa muita luz e pouco contraste. Planos longos e elaborados movimentos de câmera fazem com que o diretor capte a mesma cena através de vários ângulos sem a necessidade do corte, deixando o filme mais fluido. Ele também se utiliza de muitos planos fechados e planos-detalhe para exacerbar tanto o potencial das atuações quanto o nível de perfeição que o protagonista exige em suas peças.

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Trilha sonora assinada por Jonny Greenwood, do Radiohead, puxa para o clássico. A música é quase onipresente, forte e intensa, como um personagem. Nos momentos certos, muda de tom e se torna melodramática como em Never Cursed ou Alma, mas nunca reconfortante. Há uma apreensão, um nervosismo, uma neurose presente nos elementos repetitivos e nas cordas rápidas e oscilantes. Já a mixagem de som aumenta o volume tanto da música quanto de sons do cotidiano justamente para causar no espectador o mesmo incômodo sofrido por Reynolds.

Trama Fantasma é mais um brilhante trabalho estético e de estudo de personagem do diretor Paul Thomas Anderson. É incrível o controle que ele tem sob todos os aspectos que compõem um filme. Em uma obra cuja premissa é tão simples quanto acompanhar um recorte da vida de um estilista dos anos 50, PTA, aliado aos excelentes Daniel Day-Lewis e Lesley Manville, consegue criar suspense e prender o espectador.

Nota:

Nota 7.0

Excelente


Título Original: Phantom Thread
Data de Lançamento: 25 de dezembro de 2017
Estreia no Brasil: 22 de fevereiro de 2017
Direção: Paul Thomas Anderson
Duração: 130 minutos
Elenco: Daniel Day-Lewis, Lesley Manville, Vicky Krieps
Gêneros: Drama
País: EUA


 

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